Blog do Claudio Tognolli
Pai
do conceito de transparência no Brasil, o matemático e jornalista
Cláudio
Weber Abramo vai ser homenageado: no próximo dia 2 de julho, no
décimo congresso internacional de jornalismo da Abraji, a Associação
Brasileira de Jornalismo Investigativo (www.abraji.org.br).
Às
vésperas de completar seus 70 anos, Cláudio Weber Abramo sabe como
ninguém porque o Brasil não funciona. Afinal ele mesmo foi um dos
avôs espirituais da Lei de Acesso, sancionada por Dilma Rousseff –
e que, como se esperava, não funciona porque muita gente lá em cima
não deixa funcionar. Simples assim.
Cláudio
Weber Abramo recebeu este blog para relatar tudo o que você queria
ouvir: porque o Brasil continua um antro de corrupção, seja a dos
tucanóides Alstom, seja o dos petistas Petroleiros. Enfim: quem são
as pessoas que emperram o país e obstam a cidadania fabulando
situações caleidoscópicas, helicoidais, para que jornalistas,
sobretudo, sejam toureados.
Confira
Abramo ensinando como e porque é driblada a Lei de Acesso. E para
você, fã de promotores e procuradores, Abramo alerta: “Não há
no país instituição mais opaca do que o MP. Praticamente nada se
conhece sobre ele”.
Em
1913 o da Suprema Corte dos EUA, Louis Brandeis, escreveu que a
luz do sol é o melhor detergente. Mesmo com as sunshine laws
lá, desde 1968, tivemos o caso Snowden. Tais leis funcionam ou
são cosméticas?
Funcionam,
sim. O que esse tipo de lei estabelece é que o poder público
precisa prestar informações a respeito do que faz. No Brasil, isso
está garantido na Constituição, no Artigo 37, que estabelece o
dever de publicidade do Estado (que, por aqui, é frequentemente
confundido com a direito de o governante contratar uma agência de
publicidade…).
Coisa
um pouco diferente é o direito de qualquer pessoa pedir informações
ao poder público. Nos EUA, por exemplo, esse direito não está na
Constituição, tendo sido incluído no Freedom of Information Act
(FOIA), de 1966. No Brasil, a Constituição também garante esse
direito (no Inciso 33 do Artigo 5º), mas o texto desse artigo diz
que a prestação da informação se dará “no prazo da lei”.
Como
não havia lei, os agentes públicos de modo geral interpretavam o
“prazo da lei” como sendo infinito, e simplesmente se negavam a
cumprir a obrigação. Quem quisesse que fosse ao STF – como alguns
jornais fizeram, e venceram.
No
entanto, ir ao STF custa bastante dinheiro, de forma que não era
viável esperar que todo mundo que perguntasse alguma coisa a uma
repartição qualquer e recebesse de volta o silêncio ou uma
negativa malcriada pagasse uma fortuna para entrar com uma ação no
STF. Isso, bem como outras peculiaridades, justificou a necessidade
da lei de acesso a informação brasileira.
Pois
bem, para finalmente responder à pergunta: a lei estabelece: 1)
algumas informações que obrigatoriamente precisam ser publicadas,
independentemente da solicitação de alguém – principalmente
referentes ao gasto de dinheiro. 2) as condições sob as quais
pedidos de informação devem ser tratados: prazos, mecanismos de
recurso quando há negativa e outras.
Em
outras palavras, a lei regulamenta a oferta de informação – mas
isso não garante demanda. A demanda depende da existência de gente
que solicite informação. E isso falta muitíssimo no Brasil. Os
principais demandantes de informação em lugares menos incivilizados
são o setor privado, a imprensa, ONGs e a academia.
No
Brasil, a única que busca informações sistematicamente é a
imprensa. Algumas ONGs começam a fazer isso, mas são incipientes.
De forma que para desinfetar o Estado com a luz do sol, como afirmou
Brandeis, não basta o sol existir. É preciso haver quem queira
tomar banho de sol, por assim dizer.
Quais
as lacunas na Lei de Acesso de Dilma, da qual você foi um
dos inspiradores ?
A
lei de acesso da presidente Dilma, mas foi lentamente trabalhada ao
longo do segundo governo Lula. Duas entidades trabalharam muito para
isso: a Abraji, especialmente sob a liderança do jornalista Fernando
Rodrigues, e a Transparência Brasil. Há na lei de acesso brasileira
um dispositivo que permite a qualquer chefe de poder em qualquer
esfera definir arbitrariamente o que são informações sigilosas,
secretas etc. Isso não existia antes da lei e corresponde a um
defeito inevitável a partir do momento em que a coisa toda é
regulamentada.
Explico:
antes da lei, o presidente do Tribunal de Justiça não podia
meramente declarar “os gastos dos gabinetes dos desembargadores são
secretos”. Hoje pode, porque a lei precisava regulamentar essa
questão devido à real existência de segredos de Estado (alguns
tratados internacionais, por exemplo).
De
modo que o sujeito que é chefe de um poder define o que é secreto e
o que não é à vontade. Estão fazendo isso pelo país inteiro. É
natural perguntar: mas esse tipo de atitude é patentemente descabida
e dever haver alguém a quem recorrer. O problema é que não há, em
condições normais. A máxima autoridade de uma circunscrição
administrativa (como um tribunal, uma câmara de vereadores, um
tribunal superior) é quem decide os recursos de interessados aos
quais tenha sido afirmado que tal ou qual informação é sigilosa e
por isso não pode ser prestada.
Ou
seja, não é que a raposa entrou no galinheiro – nem sequer há
galinheiro, mas um raposeiro. Ainda pior é o que estará acontecendo
na maior parte do país com a aplicação da lei: não está sendo
aplicada, principalmente por falta de demanda. Mesmo quando há
demanda, há lugares em que os governantes agem com a maior
desfaçatez.
O
estado do Rio de Janeiro é um exemplo. Promulgou-se por lá uma
regulamentação do
acesso à informação
que não só entra em choque com a lei federal como vai além, sendo
patentemente inconstitucional.
O
que faz o Ministério Público, cujo dever é garantir o
cumprimento da lei?
Ora,
o Ministério Público. Começa pela circunstância de que não há
no país instituição mais opaca do que o MP. Praticamente nada se
conhece sobre ele. Além disso, apesar de toda a conversa de que o MP
é independente politicamente e tal e coisa, na prática a vasta
maioria dos MPs estaduais é muito comprometida. E meramente não
fazem a lei ser cumprida.
Como
a lei de acesso teria evitado coisas como caso do
escândalo metroviário em São Paulo e do Petrolão?
Esses
casos, como outros, não têm relação alguma com acesso a
informação. Têm a ver com a inépcia administrativa de quem manda
nessas empresas. Chega a ser inacreditável a incompetência da
gestão das empresas do setor metro-ferroviário paulista, que levou
a altíssimos desperdícios. A documentação correspondente não
permite outra conclusão: os caras perguntavam quanto as empresas do
cartel estavam dispostas a receber para executar os serviços e, na
sequência, diziam que o preço seria aquele. É como entrar no
botequim, perguntar o preço de um sanduíche de queijo, receber como
resposta que o preço são R$ 4,5 mil e dizer “ manda lá o
sanduíche”.
Era
literalmente assim que o Metrô e a CPTM agiam. O pior é que, por
tudo o que se sabe (ou não se sabe), devem estar fazendo mesma coisa
hoje. No caso da Petrobras, a inépcia administrativa se manifestava
na inexistência de mecanismos de controle sobre processos de
contratação realizados sob uma regulamentação (promulgada ainda
no governo FHC) notoriamente vulnerável à corrupção.
A
saber, o Conselho de Administração e a Diretoria da Petrobras
sabiam perfeitamente bem que as regras de licitação da Petrobras
são um convite à “propinagem” e, em vez de apertar os
controles, fingiram que o assunto não era com eles. Não podia dar
certo, em particular quando a empresa era governada por figuras
colocadas nos postos de comando por interesses partidários. O
espantoso seria que algo funcionasse por lá.
2 comentários:
Alguém pode, por gentileza, informar-me se o concurso da SEMEC foi prorrogado ? Desde de já, muito obrigado.
Alguém pode, por gentileza, informar-me se o concurso da SEMEC 2012 foi prorrogado ? Desde de já, muito obrigado, de verdade.
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